Resenha | Trilogia da Fundação, Isaac Asimov

Finalmente li Fundação, do Isaac Asimov. Desfrutei dessa história na mais nova publicação da editora Aleph, onde concentra a trilogia principal em uma edição definitiva muito caprichada, com ilustrações e conteúdo extra. Essa é oficialmente minha segunda leitura do autor, e diferente da primeira, desta vez tive algumas reações adversas.

Este ano venho me aventurando em diversos clássico da ficção científica. Conhecer tais obras é fascinante porque você passa a compreender o que inspirou e encantou uma geração. É necessário encarar as possíveis problemáticas levando em consideração o período em que a história foi escrita, mas há uma diferença entre tentar compreendê-las e ignorá-las. Por isso, essa é mais uma resenha no qual tentarei transmitir os sentimentos controversos que a leitura me proporcionou.

Pesquisar sobre o universo de Fundação foi essencial para me situar diante dos livros existentes da série, que é constituída por 7 livros. A trilogia principal presente nesta edição é composta pelas obras Fundação, Fundação e Império e Segunda Fundação. Depois temos a sequência com dois livros, Limites da Fundação e Fundação e Terra. Para finalizar, há também dois prequels que antecedem a trilogia principal, sendo Prelúdio à Fundação e Crônicas da Fundação.

Em um futuro muito distante, onde a humanidade já dominou a galáxia e a coloniza em milhares de planetas, um cientista chamado Hari Seldon prevê o fim do Império que a governa e consequentemente a perda de todo o conhecimento. Isso resultaria na decadência da humanidade, que se veria novamente em condições bárbaras, levando aproximadamente 30 mil anos para se superar. Antes de nos aprofundarmos no problema, como Hari Seldon foi capaz de prever essa tragédia?

“O ser humano individual é imprevisível, porém as reações das multidões humanas, descobriu Seldon, podem ser tratadas estatisticamente”.

Acontece que ele é um dos maiores cientistas da psico-história, uma ciência que combina a matemática e a sociologia. Ou seja, Hari Seldon era capaz de prever o movimento da sociedade em massa. Após sua premonição, medidas precisaram ser tomadas para evitar que a humanidade passasse tanto tempo na escuridão, sem o poder do conhecimento. Para isso, foram criadas duas Fundações, cada uma posicionada no extremo oposto da Galáxia. A primeira Fundação, estabelecida no planeta Términus, ficou responsável por não só preservar, mas também difundir o conhecimento e a tecnologia. A segunda, ninguém soube muito bem qual seria o seu papel, nem onde estaria localizada de fato.

As duas Fundações ficaram responsáveis por diminuir o período de queda e transtorno do Império de 30 para mil anos, no qual elas se ergueriam e se estabeleceriam como o Novo Império, liderando assim, a humanidade.

Achei extraordinário como as duas leituras do autor que realizei me proporcionaram experiências completamente diferentes. Enquanto que em Eu, Robô eu me deparei com personagens carismáticos e contos divertidos, em Fundação me vi diante de uma história mais séria, complexa e grandiosa.

“O plano de Seldon ajuda aqueles que se ajudam”.

O principal motivo do meu fascínio com relação a essa trama foi justamente a psico-história. Ela é tão crível e ao mesmo tempo plausível, que você se deixa levar pelos dons científicos de Hari Seldon e crer que tudo o que ele preveu de fato irá acontecer, porque tudo é matematicamente calculado. Entretanto, algo que o cientista não pode prever é a ação de indivíduos de forma isolada, então isso poderia colocar em xeque todo o seu estratagema. Não poderia? Essa foi a grande cereja do bolo, observar os movimentos de cada personagem tentando compreender se eles iriam contribuir ou atrapalhar o grande plano de Seldon.

A partir da previsão, acompanhamos a história no decorrer de centenas de anos, entre a calculada queda do Império Galáctico, o surgimento da Fundação e suas principais crises – algumas também previstas surpreendentemente por Hari Seldon. Nesse tempo, outros nomes importantes se juntam a Seldon na história da humanidade, como governantes, líderes e até mesmo heróis improváveis. Cada livro é composto por um compilado de contos apresentados em ordem cronológica, e Asimov foi capaz de surpreender em todos eles.

Apesar de não ter me apegado a quase nenhum personagem – entraremos mais a fundo neste quesito em instantes – acredito que a grande protagonista da história seja a própria Fundação, porque acompanhamos partes importantes de sua jornada, seu surgimento, momentos de conflito e triunfo.

Talvez o fato de não ter me apegado aos personagens, seja porque não me vi em quase nenhum deles. É aqui que entramos na principal problemática do livro. Sei que existem polêmicas envolvendo o autor, mas sinceramente, como desejo ler ainda algumas de suas histórias, decidi não me aprofundar nelas porque não pratico muito bem a arte de separar a obra do autor. Voltando ao assunto do tópico, levaram aproximadamente 200 páginas para a primeira personagem feminina ser citada. Sério, até então, parecia que eu estava vivenciando uma distopia onde as mulheres não existiam. Para vocês terem uma ideia, no primeiro livro da trilogia não existe nenhuma personagem feminina relevante, que tenha uma participação ativa na história.

Para meu alívio, isso mudou no segundo livro, que deu a uma personagem feminina o papel de destaque. No entanto, em toda a trilogia, temos pouquíssimas personagens relevantes. E para piorar, há também inúmeras declarações misóginas ao longo da história. Apesar de estar amando a história por apresentar uma trama tão complexa, ao mesmo tempo existia um incômodo eminente, porque eu não conseguia me enxergar nela.

“A violência é o último refúgio do incompetente”.

O final não é tão conclusivo quanto eu esperava, então entendo a existência dos demais livros. Estou tentada em dar continuidade a série, mas antes disso preciso avaliar os prós e contras. Não vou negar que esperava gostar mais da história, afinal estamos falando da obra máxima de Asimov. Na verdade, acho que eu esperava me incomodar menos com ela, e consequentemente, ter uma experiência de leitura mais positiva, digna de virar favorita.

Ainda assim, é possível enxergar o porquê de a história ser tão importante e popular até os dias atuais. Mesmo um pouco frustrada, admito que essa foi uma leitura enriquecedora, porque a sagacidade do autor para construir um universo tão rico e uma trama absurdamente inteligente me deixou surpresa e eufórica em diversos momentos.

Exemplar cedido em parceria com a editora.


Trilogia da Fundação

Título: Trilogia da Fundação (Edição Deluxe)
Autor: Isaac Asimov
Tradução: Fábio Fernandes e Marcelo Barbão
Editora: Aleph
Ano: 2019
Páginas: 896
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Sinopse:  Obra máxima de Isaac Asimov, a Trilogia da Fundação foi eleita a melhor série de ficção científica e fantasia de todos os tempos – superando trabalhos premiados como O Senhor dos Anéis, de J.R.R. Tolkien. Os livros que compõem a série – Fundação, Fundação e Império e Segunda Fundação – surgem agora em volume único, em uma edição de colecionador com acabamento de luxo, capa dura e 24 ilustrações coloridas de Alexander Wells. Uma obra à altura do legado do mestre. Os livros contam a história da humanidade em um ponto distante no futuro, no qual o visionário cientista Hari Seldon prevê a destruição total do império humano e de todo o conhecimento acumulado por milênios. Mas incapaz de impedir a tragédia, ele arquiteta um plano ousado, em que será possível reconstruir a glória da raça humana. Se tudo correr como o planejado.

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4 Comments

  1. Jessica Rabelo

    Oi Gih.
    Eu concordo bastante com você. Apesar de entender que livros clássicos tendem a ter problemas com suas narrativas por conta do tempo que foram escritos, não podemos ignorar e aceitar: penso que, se podemos definir a literatura como subversiva, a subversão e não proliferação de valores podem certamente aparecer.
    Gostei bastante das suas impressões. Eu espero me animar com o Isaac futuramente. E considerando que suas indicações têm me rendido minhas melhores leituras, suponho que vou gostar bastante.
    Beijos.
    Fantástica Ficção

  2. Karen Soarele

    “parecia que eu estava vivenciando uma distopia onde as mulheres não existiam.”

    Pensei a mesmíssima coisa enquanto lia!!

  3. Karen Isabelle Soares

    Também é chato que a primeira mulher em papel de destaque só aparece pra servir de interesse amoroso…

    E as duas únicas mulheres da trilogia inteira são as únicas personagens a terem descrição física!

  4. FARIAS ISRAEL

    Olá Gisele;
    Meu nome é Farias. J.Farias.
    Tenho 65 anos e sou leitor de vários estilos, sendo a ficção científica a minha preferida. Cheguei ao seu site buscando imagens sobre fitoterapia (trabalho nesta área). Suas resenhas, dicas e comentários (técnica e por vezes poética) ganharam a minha atenção e curiosidade. Mas o que mais me encantou foram algumas imagens na resenha da trilogia do clássico Fundação (I.A). O que tem nelas além da própria ilustração do livro? Xícaras (com chás; espero), vidros de óleos, ervas e velas. Um encantador conjunto de beleza e bom gosto.
    Meus respeitos e parabéns pelo site.
    Saudações sci-fi.
    Ps.
    O título do site não foi apenas criativo. Chega a ser emblemático. Icônico, mesmo!
    Resenhe por favor: Galáctica e Star Trek.
    Respeitosamente: J.Farias Israel.

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