Resenha | O Silêncio da Casa Fria, Laura Purcell

Essa foi uma das experiências de leituras mais inusitadas que tive nos últimos dias. Comecei a ler essa história sem saber absolutamente nada sobre ela, nem ao menos a sinopse ou o gênero. Cada linha foi uma surpresa, cada página revelou um mistério que me deixou completamente ansiosa para descobrir o que estava por trás dos acontecimentos estranhos da casa fria.

O início da história é uma incógnita. Elsie está internada e não consegue se lembrar nem falar sobre o que a levou até lá. Os últimos acontecimentos foram traumáticos, mas ela sempre teve uma vida difícil. Aos poucos, com o auxílio de um médico jovem e atencioso, ela começa a tentar se lembrar escrevendo através de um diário. A primeira lembrança é dolorosa, Elsie se recorda de perder o marido logo após o casamento e ter de se dirigir a uma das propriedades dele para ficar durante a sua gestação.

A casa, conhecida como A Ponte, está na família há muitas gerações, mas encontra-se mal cuidada, quase abandonada. Elsie é uma das últimas parentes vivas de seu marido, com exceção de Sarah, uma prima distante que se junta a ela para fazer lhe companhia durante esse tempo. A Ponte está localizada em um vilarejo distante e pacato, onde as pessoas aprenderam a temer a casa por conta de inúmeras histórias.

Elsie não é o tipo de personagem que cativa à primeira vista. Pelo contrário, sua dualidade nos faz ficar com o pé atrás com relação ao caráter dela, mas no decorrer da história você passa a enxergá-la como uma pessoa real. Que tem erros e acertos e um passado conturbado, que a deixou bastante marcada. Ela nunca almejou um final feliz, mas tê-lo vislumbrado tão próximo de si, através do breve casamento, a deixou ainda mais fragilizada.

A própria casa representa um personagem muito importante com todo o seu frio e silêncio. Acompanhamos histórias dentro de histórias para compreender um pouco do seu passado, tendo a oportunidade de vê-la através de outros pontos de vista. Cada rumor e história dá à Ponte um aspecto cada vez mais sombrio, mas até onde vai a realidade e começa a imaginação das pessoas?

A trama apresenta momentos de pura tensão e de gelar a espinha. Eu, como uma mera leitora que não está tão acostumada ao gênero, fiquei apreensiva e com medo, porque a autora soube cadenciar muito bem os momentos de mistério, terror e reviravoltas. E por falar em reviravoltas, eu fiquei com muito medo da história não ter uma conclusão digna no final, porque faltavam poucas páginas para acabar e muita coisa para resolver. Porém, a autora encontrou uma solução plausível, que na realidade estava diante dos meus olhos o tempo todo.

Uma das primeiras coisas que fiz quando finalizei o livro foi procurar a data da publicação original. Me surpreendi quando vi que Laura Purcell é uma escritora contemporânea, mas ela deu a esse livro uma atmosfera do século XIX impressionante. É sombria, melancólica e muito misteriosa; ela deu a história uma aura incrivelmente vitoriana.

A história também faz uma crítica ao quanto a mulher era silenciada no passado, em como era difícil as pessoas acreditarem em suas afirmações quando não eram validadas por um homem. Ainda mais quando essas afirmações se distanciavam do senso comum, automaticamente elas eram acusadas de loucas ou doentes. 

Os detalhes da edição, como sempre, fazem jus a editora. Quanto mais você avança na história, enxerga como ela foi pensada e criada com carinho, porque cada elemento da capa (que são muitos) e da edição no geral, estão presentes na história, fazendo referência a diversos eventos dela. Isso em particular fez meus olhos brilharem!

Histórias de terror não são o meu forte. Talvez se eu soubesse da premissa antes de pegar o livro, eu teria desistido de encarar ele. Ainda bem que não foi isso que aconteceu, porque eu perderia a chance de conhecer uma ótima história, que me marcou e despertou o meu interesse de conhecer outras como ela.

Recomendo que você leia este livro em uma noite fria, na companhia de uma boa bebida quente. Mesmo se o clima não estiver assim, garanto que a atmosfera sombria e fria do livro irá te envolver. Você se verá em um ambiente cercado pela névoa de mistérios que a trama esconde, ávido para tentar descobrí-los. Mas cuidado, algumas portas devem permanecer trancadas.

Exemplar cedido em parceria com a editora.


O Silêncio da Casa Fria

Título: O Silêncio da Casa Fria
Autores: Laura Purcell
Tradução: Camila Fernandes
Editora: Darkside Books
Ano: 2020
Páginas: 288
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Sinopse: Quando Elsie perdeu o marido apenas algumas semanas após o casamento, achou que já tinha sofrido o suficiente para uma vida inteira. Praticamente sozinha em uma casa enorme e isolada, ela jamais imaginou que os companheiros silenciosos — painéis de madeira que imitavam pessoas em atividades cotidianas —, um dia, seguiriam seus movimentos com os olhinhos pintados. Muito menos que eles apareceriam por conta própria em cômodos aleatórios…
Para escrever este livro, a autora Laura Purcell se inspirou em um costume europeu popular nos séculos XVIII e XIX, especialmente entre os ingleses e holandeses. Nele, famílias aristocráticas pregavam peças com tábuas de madeira ricamente pintadas e esculpidas. Criados, soldados, plantas, animais… e, aqui, uma criança estranhamente familiar, com um sorriso travesso e uma rosa branca na mão.
Com uma habilidade narrativa que transporta o leitor para a época vitoriana — e suas densas neblinas, costumes peculiares, a tão presente discussão entre a ciência e o sobrenatural —, Laura Purcell desenrola uma trama cheia de nuances enquanto Elsie vai abrindo as portas da casa para tentar desvendar o mistério dos companheiros — e também do seu passado. O tempo, às vezes, demora a passar no silêncio da casa fria.
Com a atmosfera lúgubre típica das histórias de fantasma vitorianas, O Silêncio da Casa Fria honra os melhores contos góticos. A história de uma mulher confrontada com um medo irracional, que coloca em xeque sua própria sanidade. Estaria Elsie vendo coisas como forma de dar sentido ao luto? Ou realmente havia algo sobrenatural morando sob o mesmo teto que ela?

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