Resenha | Matadouro Cinco, Kurt Vonnegut
Como fã de ficção científica, já faz um bom tempo que anseio ler os livros de Kurt Vonnegut. Vi essa oportunidade vir à tona com o lançamento de Matadouro Cinco, publicado pela editora Intrínseca em uma edição comemorativa de 50 anos. Preciso destacar que a primeira experiência lendo um livro do autor começou com uma tremenda rasteira, porque a história foi completamente diferente do que eu esperava.
O primeiro capítulo do livro nada mais é do que uma introdução da história. Nele, temos um relato autobiográfico de Kurt Vonnegut apresentando algumas de suas motivações para a criação dela, e apesar de um tanto confusa, acredito que ela é essencial para nos preparar para o que está por vir. Aliás, confusão é o que você irá sentir no primeiro terço do livro, porque o plot é assim mesmo; confuso.
Billy Pilgrim foi um dos sobreviventes do grande massacre de Desdren, ocorrido durante a segunda guerra mundial. Na época, em 1945 (sim, quase no finzinho da guerra), ele estava na cidade alemã como prisioneiro. No entanto, outros aspectos são capazes de chamar a atenção na pacata vida pós-guerra de Billy: ele está solto no tempo, então viaja constantemente para o passado e o futuro, sem ter noção ao certo do que é o presente. Mas não podemos parar por aí, Billy também teve uma experiência fora da terra, quando foi abduzido por uma raça alienígena.
“Entre as coisas que Billy Pilgrim não podia mudar estavam o passado, o presente e o futuro.”
Misture tudo isso e teremos a incrível narrativa de Matadouro Cinco: confusa, psicodélica e dolorosamente real. Para melhorar, o autor decidiu apresentar tudo isso de forma não-linear, como se estivéssemos de fato na cabeça de Billy, viajando no tempo. Tudo isso é disposto através de parágrafos e capítulos curtos, instigando o leitor a querer compreender a história.
Este é o primeiro livro que leio sobre guerras que mostra uma visão completamente pessimista sobre a mesma, onde não há honrarias, momentos de triunfo e glória. Aqui tudo é feio, cruel e desnecessário. Por incrível que pareça, Vonnegut demonstra isso através de uma narrativa leve, com toques de humor e sarcasmo. O maior exemplo é o seu famigerado bordão, “É assim mesmo”, presente não só em diversos parágrafos, mas também na contra-capa da edição. Ele utiliza dessa expressão copiosamente para banalizar as atrocidades da guerra, porque neste período tudo se torna absurdamente comum, então é assim mesmo.
“Esta história quase não tem personagens nem confrontos dramáticos, pois a maioria das pessoas que aparecem nela está muito abatida e não passa de joguete de forças descomunais. Um dos principais efeitos da guerra, afinal, é fazer com que as pessoas não se animem a ser personagens”.
A partir do primeiro capítulo/introdução, entendemos que esse é o principal objetivo de Vonnegut, demonstrar como a guerra não faz sentido, que tudo o que sai dela é ruim. Foi por causa disso que ele quis retratar sobre Dresden, porque ele esteve presente durante o bombardeio e vivenciou todo o caos que se seguiu após isso. O autor faz um paralelo com suas próprias experiências, evidenciando que o antagonismo estava nos dois lados da guerra, porque tiveram diversas crueldades de ambas as partes.
Os elementos de sci-fi são o pano de fundo para uma história baseada em fatos reais. Eles não são nem mesmo aprofundados, mas não me senti incomodada com isso. A partir do momento que começamos a acompanhar a jornada de Billy Pilgrim, tudo o que importa de verdade é montar o quebra-cabeça que nos é apresentado e chegar ao fatídico acontecimento, o massacre de Dresden.
“O livro é tão curto, tão confuso, tão desarmônico, Sam, porque nada de inteligente pode ser dito sobre um massacre”.
De modo geral, a minha primeira experiência com Kurt Vonnegut foi um pouco morna, por mais controverso que isso pareça ser. Confesso que não valorizei tanto a leitura, mas esse é o tipo de livro que te faz refletir muito após finalizá-lo e a melhor coisa que fiz foi esperar para escrever essa resenha. Quanto mais penso nele, mais enxergo a genialidade do autor. Apesar de não ter caído completamente nas graças de Vonnegut à primeira vista, consigo compreender toda a relevância que a sua obra carrega, principalmente considerando o momento em que ela foi publicada.
Por consequência de tudo isso, estou mais do disposta a conhecer as demais histórias dele. Uma pequena dica para quem já leu, está lendo ou pretende ler: após finalizar a leitura, leia novamente o primeiro capítulo/introdução. Garanto que irá contribuir muito com a sua experiência.
Exemplar cedido em parceria com a editora.
Título: Matadouro Cinco (ou A Cruzada das Crianças – Uma Dança Compulsória Com a Morte)
Autor: Kurt Vonnegut
Tradução: Daniel Pellizzari
Editora: Intrínseca
Ano: 2019
Páginas: 288
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Sinopse: Edição comemora os 50 anos de um clássico moderno, o mais importante da obra de Kurt Vonnegut.
O humor e estilo únicos e originais de Kurt Vonnegut o fizeram um dos escritores mais importantes da literatura norte-americana. Sarcástico, ele foi capaz de escrever sobre a brutal destruição da cidade de Dresden, na Alemanha, durante a Segunda Guerra Mundial — sem apelar para descrições sensacionalistas. Em vez disso, criou uma história imaginativa, muitas vezes engraçada e quase psicodélica, estrategicamente situada entre uma introdução e um epílogo autobiográficos.
Assim como Billy Pilgrim, o protagonista de Matadouro-Cinco, Vonnegut testemunhou como prisioneiro de guerra, em 1945, a morte de milhares de civis, a maior parte deles por queimaduras e asfixia, no bombardeio que destruiu a cidade alemã. Billy tinha sido capturado e destacado para fazer suplementos vitamínicos em um depósito de carnes subterrâneo, onde os prisioneiros se refugiaram do ataque dos Aliados. Salvo pelo trabalho, depois de ter visto toda sorte de mortes e crueldades arbitrárias e absurdas, Billy volta à vida de consumo norte-americana e relata sua pacata biografia, intercalando sua trajetória aparentemente comum com episódios fantásticos de viagens no tempo e no espaço.
Ao capturar o espírito de seu tempo e a imaginação de uma geração — afinal, o livro foi publicado originalmente em 1969, em plena guerra do Vietnã e de intensos protestos e movimentos culturais —, o livro logo virou um fenômeno e sua história e estrutura inovadoras se tornaram metáforas para uma nova era que se aproximava. Ao combinar uma escrita cotidiana, ficção científica, piadas e filosofia, o autor também falou das banalidades da cultura do consumismo, da maldade humana e da nossa capacidade de nos acostumarmos com tudo. Qualquer semelhança com a atualidade não é mera coincidência.
Fe Akemi
Oiee!!
Essa sci-fi parece ser um tanto diferente mesmo e chamou minha atenção por ter a Guerra, assunto que aprecio em minhas leituras, e ser de fatos reais, outra coisa que chama demais meu interesse.
O comecinho achei que poderia ser meio confuso essas viagens do personagem, mas depois entendi um pouco do propósito. Com certeza é uma leitura bastante interessante e obrigada pela dica final.
bjs
Viviane Ferreira Oliveira
Na verdade a introdução devia estar no fim né rsrsrs, entendi!
Vi muitos elogios dessa obra por aí, mas confesso que estou com o pé atras para ler… a confusão me parece um pouco demais do necessário.
Mas talvez seja esse o diferencial mesmo, afinal, a guerra tb é demais e desnecessária…
Osenhordoslivrosblog.wordpress.com
Eloise
Oi Gisele,
Nossa, esse livro parece mexer com nossas emoções. Achei a interessante a forma que o autor trabalhou o tema guerra, mostrando todo lado sombrio, negativo e cruel dela, que é uma realidade. Eu gosto quando a trama se baseia em fatos reais e achei bacana e diferente ele ter trabalhado guerra com viagem no tempo. Fico ainda mais curiosa pela leitura ao saber que o livro carrega elementos que aprecio, mas de uma forma diferente e original.
Necessito!
Bjos da Elo!
http://cronicasdeeloise.blogspot.com/
Jessica Rabelo
Oi Gisele.
Engraçado como refletir sobre uma obra pode nos fazer amar ou detestar independente do tipo de leitura que tivemos. Eu sinceramente amo livros que conseguem mudar minha perspectiva então fiquei animada com a obra. Mesmo inicialmente controverso, acredito que amaria a leitura em todas as suas nuances.
Beijos.
Fantástica Ficção
Joyce Santos
Já eu não gostava de ficção científica até sábado passado kkk, achava a leitura cansativa e chata, mas recebi um livro de um autor e decidi dar uma chance ao gênero e qual não foi a minha surpresa?! Estou apaixonada num livro de quase 700 páginas (algo que não gosto também, muitas páginas, dá preguiça).
E conclui que um livro bom pode mudar totalmente sua visão sobre determinados gêneros.
Já quero ler esse aí também, parabéns pela resenha.
Bjus.
Mirelle Almeida
Olá, Gi. Tudo bem?
Menina, eu acho essa capa uma beleza. Fico triste pelo livro não ter te prendido tanto, mas faz parte, né? Eu não costumo ler muita ficção científica, mas é um gênero que me chama a atenção. Fiquei curiosa com a história e vou anotar o livro na minha lista. Amo livros que falam da Guerra Mundial, e fiquei interessada com a perspectiva dessa obra. Gosto de livros que mostram a realidade desencarnada.
Beijos
Ana Claudia Ponce
Já vi algumas resenhas bastante positivas sobre esse livro, e fiquei bem curiosa pela leitura. Curto ler histórias que envolvam esse período, o da II Guerra Mundial, achei interessante o posicionamento do autor, afinal, é assim mesmo, uma guerra não bonita. Beijos e obrigada pela dica.
Isadora Santos
Com certeza um livro cheio de realidade e dureza, misturada com uma pitada de sci-fi, uma mistura nova e intrigante, gosto da parte que você fala que é um livro feio, que mostra as partes da guerra , aonde não se tem heroísmo ! Fiquei com muita vontade de ler!!
Isa do @leportraitdeisa