Resenha | Circe, Madeline Miller
Circe foi uma das leituras mais aguardadas que realizei em 2019. Porém, enquanto esperava o momento certo para realizá-la, acabei me deparando com várias críticas, tanto positivas quanto negativas. Isso serviu para que eu pudesse controlar minhas expectativas e também me preparar para uma leitura que seria muito diferente do que eu esperava.
Circe vive uma vida solitária em um ambiente hostil, onde o poder da magia e da beleza dos deuses, titãs e ninfas regem a conduta do local. Sem os atributos para garantir que ao menos seja notada, Circe começa a se refugiar no mundo dos humanos, observando um estilo completamente diferente, comum e frágil.
Quando ela se apaixona por um humano, além de descobrir que a hostilidade se esconde sob todos os tipos de camadas, ela finalmente conhece seu verdadeiro poder, algo estranho e até então desconhecido; o poder da feitiçaria. É só quando ele vem à tona que Zeus a confina em uma ilha deserta, temendo o que ela possa fazer contra os demais deuses.
“Por cem gerações, eu tinha caminhado o mundo sonolenta e entediada, ociosa e confortável. Não deixei marcas, não realizei feitos. Mesmo aqueles que tinham me amado um pouco não se importaram o bastante para ficar”.
Assim como a princípio, ela volta a ficar confinada com a solidão, mas desta vez ela está sozinha de verdade. Por tudo o que ela já viveu e presenciou, agora finalmente Circe começa a se conhecer e a se preencher sozinha. A explorar seus estranhos poderes e testar suas habilidades de bruxa. Circe foi banida de conviver com os demais seres, no entanto, a ilha não foi banida do mundo. Dessa forma, Circe acaba recebendo visitas de tempos em tempos. Algumas bem-vindas, que trazem o calor e as notícias do mundo, e outras nem tanto.
“Deixe-me dizer o que a magia não é: não é poder divino, que vem com um pensamento e um piscar de olhos. Deve ser feita e trabalhada, planejada e procurada, desenterrada, secada, fatiada e moída, cozinhada, encantada e cantada. Mesmo depois de tudo isso, pode falhar, ao contrário dos deuses”.
A princípio tive dificuldades com a leitura, porque tudo pareceu muito superficial. Desde as atitudes de Circe até daqueles com quem ela convivia. No entanto, no decorrer das páginas compreendi que isso poderia ser proposital, porque durante muito tempo Circe agiu de forma passiva tanto com relação ao modo como era tratada quanto como ela mesma se via.
Quando Circe acorda para a realidade a narrativa ganha força junto com a personagem. Dentro de sua solitária trajetória, ela mergulha no autoconhecimento e começa a descobrir seu verdadeiro poder. Dessa forma, o livro é dividido através de subtramas, marcando as passagens mais significativas de Circe. Suas descobertas, feitos e amores. É também de forma gradativa que me vi envolvida com a história. Admito que esperava algo bem diferente, mas acabei gostando de ser surpreendida. A jornada de Circe apresenta toda uma evolução gratificante, que compensa e ofusca o frustrante início.
“Humilhar mulheres para ser um dos passatempos preferidos dos poetas. Como se não pudesse haver uma história se não rastejarmos e choramingarmos”.
Não faço parte da geração leitora de Percy Jackson, que cresceu próxima dos mitos gregos, então meu conhecimento era bem superficial. Foi só recentemente, após ler Mythos do Stephen Fry, que o meu interesse sobre a mitologia aumentou. Foi interessante ver as histórias que se cruzam com as de Circe e também observá-las através de outra ótica. Aos poucos, estou redescobrindo e saciando minha curiosidade sobre a mitologia grega.
“Então aprendi que podia curvar o mundo à minha vontade, como um arco é curvado para uma seta. Eu teria praticado toda aquela labuta mil vezes para manter esse poder em minhas mãos”.
A dica é não ir com muita sede ao pote. Se assim como eu, você espera ler Circe com muitas expectativas, recomendo moderá-las. O livro pode ser diferente do que você espera, principalmente pela forma com que ele é narrado. Circe possui uma vida muito solitária, onde os acontecimentos e as pessoas que ela conhece são marcados de forma muito intensa. Entre séculos de isolamento e monotonia, de repente ela se vê diante de situações que exigem todo o seu poder e autoconfiança. O livro não possui grandes momentos de clímax, mas surpreende e vale muito a pena pelas suas particularidades.
Título: Circe
Autora: Madeline Miller
Tradução: Isadora Prospero
Editora: Planeta (Minotauro)
Ano: 2019
Páginas: 368
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Sinopse: Na casa do grande Hélio, divindade do Sol e o mais poderoso da raça dos titãs, nasce uma menina. Circe é uma garotinha estranha: não parece ter herdado uma fração sequer do enorme poder de seu pai, muito menos da beleza estonteante de sua mãe, a ninfa Perseis. Deslocada entre deuses e seus pares, os titãs, Circe procura companhia no mundo dos homens, onde enfim descobre possuir o poder da feitiçaria, sendo capaz de transformar seus rivais em monstros e de aterrorizar os próprios deuses.
Sentindo-se ameaçado, Zeus decide bani-la a uma ilha deserta, onde Circe aprimora suas habilidades de bruxa, domando perigosas feras e cruzando caminho com as mais famosas figuras de toda a mitologia grega: o engenhoso Dédalo e Ícaro, seu filho imprudente, a sanguinária Medeia, o terrível Minotauro e, é claro, Odisseu.
E os perigos são muitos para uma mulher condenada a viver sozinha em uma ilha isolada. Para proteger o que mais ama, Circe deverá usar toda a sua força e decidir, de uma vez por todas, se pertence ao reino dos deuses ou ao dos mortais que
ela aprendeu a amar. Personagens vívidos e extremamente cativantes, aliados a uma linguagem fascinante e um suspense de tirar o fôlego, fazem de Circe um triunfo da ficção, um épico repleto de dramas familiares, intrigas palacianas, amor e perda. Acima de
tudo, é uma celebração da força indomável de uma mulher em meio a um mundo comandado pelos homens.
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