Resenha | Um Lugar Bem Longe Daqui, Delia Owens
Um Lugar Bem Longe Daqui foi o livro que mais me surpreendeu em 2019. Além de ter me rendido a leitura por causa da hype, admito que a premissa não havia me chamado muito a atenção. Eu simplesmente precisava saber por que todo mundo estava falando sobre esse livro. Não lembro quanto tempo faz que eu me envolvia tanto com uma história, pensando nela durante o dia e torcendo pelos personagens.
A mágica vai acontecendo aos poucos, no decorrer das páginas. Kya teve que aprender a se virar sozinha desde muito pequena. Aos seis anos, viu sua mãe e seus irmãos abandoná-la, deixando-a com o pai de temperamento instável e abusivo. Ele passava dias fora sem qualquer satisfação, até um determinado momento em que simplesmente não retornou mais.
Dessa forma, Kya fez o que pode para sobreviver, tendo como principal companhia o brejo onde ficava o barracão em que ela morava. A conexão que ela cria com a natureza, que é a sua principal fonte de aprendizado e também sobrevivência, foi um dos elementos que mais me cativou durante a história.
“A natureza tinha cuidado dela, protegera-a e fora sua professora quando ninguém mais quisera fazê-lo.”
Entretanto, também temos alguns vislumbres de um futuro não muito distante, onde um corpo é descoberto no mesmo local em que Kya mora. Fiquei intrigada para compreender a partir de qual momento as duas histórias se entrelaçavam, mas a princípio confesso que não estava muito interessada nesse mistério. Eu queria saber como Kya faria para sobreviver.
O mistério do corpo encontrado vai ganhando significado ao longo da história. Existem muitos enigmas sobre a causa da morte, principalmente se foi um homicídio ou assassinato. Quase não há vestígios sobre o que realmente aconteceu, o que intriga o delegado e seus companheiros. Conforme avançamos na história de Kya, passamos a conhecer os moradores da cidade e por consequência especular o motivo da morte, quem poderia estar por trás dela ou qual a motivação de quem a fez. Se a fez.
“Vamos ser honestos, muitas vezes o amor não dá certo. Mas, mesmo quando fracassa, conecta você aos outros, e no fim isso é tudo que você tem: conexões.”
Tudo a princípio é muito nublado, por isso o enredo de Kya se mostra mais interessante. No entanto, as histórias começam a se entrelaçar no momento certo. Eu senti um Q de drama novelesco que sinceramente adoro, e acho que foi por isso que me senti tão envolvida com a leitura.
Kya se mostrou uma das minhas personagens favoritas da literatura. Além de sagaz e inteligente, é incrível a forma como ela se fortalece e utiliza de suas fragilidades para crescer. Como ela encarou cada preconceito destinado a ela. Os moradores do vilarejo tratam o brejo com muito desdém e não fazem a mínima ideia de sua importância para o local onde vivem. Da mesma forma eles tratam Kya, que é conhecida como a Menina do Brejo.
“(…) assim como as estrelas, o tempo não é fixo. O tempo avança e se dobra ao redor de planetas e sóis, é diferente nas montanhas e vales, e faz parte da mesma matéria que o espaço, que se dobra e incha como o mar. Os objetos, sejam eles planetas ou maçãs, caem ou orbitam, não por causa de alguma energia gravitacional, mas por despencarem nas dobras sedosas de espaço-tempo criadas por objetos de massa maior, como nos círculos concêntricos de um lago.”
A empatia pela personagem surge com naturalidade. Sentimos cada abandono com muito aperto no coração, por isso me senti tão envolvida com a história. Tão envolvida com Kya. A autora trilha uma narrativa com muita destreza, sabendo equilibrar muito bem as duas tramas. Aliás, a escrita dela é outro elemento que já gostei logo de cara. Ela tem um aspecto fluido, mas que ao mesmo tempo capta e nos entrega todos os elementos da cena. Há inclusive um toque de poesia, que combina perfeitamente com o tom da história.
O livro me envolveu do início ao fim. Quanto mais me aproximava do desfecho, mais me sentia angustiada e intrigada. As coisas pareciam muito longe de se resolver de forma satisfatória. No entanto, é principalmente aí que a autora demonstra sua genialidade. Delia Owens foi capaz de surpreender até a última página, fazendo minha cabeça explodir e meu peito pular de empolgação.
“Folhas de outono não caem; elas voam. Elas tomam seu tempo e vagam nesta que é sua única chance de voar.”
Não é à toa que Um Lugar Bem Longe Daqui levou o título de minha melhor leitura do ano. Para quem não esperava muito, fui gratificada com um enredo inteligente e uma personagem que ficará marcada para sempre. Quanto mais penso nela, aprecio ainda mais a história. É uma trama que se inicia com simplicidade, se desenrola de forma surpreendente e fecha com chave de ouro. Esse é o livro que indico de olhos fechados, para todos lerem. Independente se esse é o tipo de história ou não, você precisa se render a ela, assim como eu.
Exemplar cedido em parceria com a editora.
Título: Um Lugar Bem Longe Daqui
Autora: Delia Owens
Tradução: Fernanda Abreu
Editora: Intrínseca
Ano: 2019
Páginas: 336
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Sinopse: Por anos, boatos sobre Kya Clark, a “Menina do Brejo”, assombraram Barkley Cove, uma calma cidade costeira da Carolina do Norte. Ela, no entanto, não é o que todos dizem. Sensata e inteligente, Kya sobreviveu por anos sozinha no pântano que chama de lar, tendo as gaivotas como amigas e a areia como professora. Abandonada pela mãe, que não conseguiu suportar o marido abusivo e alcoólatra, e depois pelos irmãos, a menina viveu algum tempo na companhia negligente e por vezes brutal do pai, que acabou também por deixá-la.
Anos depois, quando dois jovens da cidade ficam intrigados com sua beleza selvagem, Kya se permite experimentar uma nova vida — até que o impensável acontece e um deles é encontrado morto.
Ao mesmo tempo uma ode à natureza, um emocionante romance de formação e uma surpreendente história de mistério, Um Lugar Bem Longe Daqui relembra que somos moldados pela criança que fomos um dia e que estamos todos sujeitos à beleza e à violência dos segredos que a natureza guarda.
A obra foi incluída no clube de livros de Reese Witherspoon, que posteriormente adquiriu os direitos de adaptação cinematográfica e vai produzir o filme com a Fox 2000.
Angelica
Nossa, não tenho como descordar que é uma trama super inteligente. No começo tive várias desconfianças na morte do personagem e fui mudando de opinião no decorrer da história… a Kya demorou a me cativar, mas o fato de ela ter sido abandonada e ter aprendido a viver sozinha e se virar naquele brejo foi algo que só pessoas fortes podiam fazer…
De modo geral gostei bastante da leitura, mas acho que não fica nos meus favoritos…