Laranja Mecânica e as leituras fora da zona de conforto

Existe uma série de fatores que fazem com que uma leitura apresente um alerta para a sua zona de conforto. Esses aspectos podem depender do gênero, temáticas abordadas na história e até mesmo tipos de narrativa. Mesmo que sair da sua zona de conforto seja, na maioria das vezes desconfortável, ainda assim é necessário.

O motivo pelo qual mantive distância de A Laranja Mecânica durante um tempo foi principalmente por causa da sua temática principal: a ultraviolência. É preciso enfatizar que essa história possui inúmeros gatilhos para as formas mais vis de violência, que vai desde a embates sangrentos até o estupro coletivo.

Então me preparei muito para finalmente conseguir encarar essa leitura, porque não costumo lidar bem com maldade humana. Mais aguçado que o meu medo era a minha curiosidade de saber mais sobre a história. Aos trancos e barrancos, orgulhosamente consegui finalizar o livro, mas não sem pensar em abandoná-lo várias vezes.

Falando um pouco sobre a história, em Laranja Mecânica nos deparamos com um futuro distópico onde a violência tomou conta das ruas. Gangues e mais gangues passam a noite em claro à procura do caos, assaltando, espancando e estuprando pessoas. A história é narrada através de Alex, um dos líderes dessas gangues.

Não pensem que o início dessa história é o que causa mais horror, ela me deixou com esse sentimento do início ao fim. Outro aspecto importante sobre a história e que pode causar também um estranhamento por parte dos leitores é o dialeto utilizado pelos adolescentes. A gíria foi intitulada pelo autor como nadsat, uma língua criada por ele mesmo. Entre inserir gírias que com o tempo pudessem soar antiquadas, Anthony Burgess decidiu criar seus próprios jargões. Foi difícil compreender algo da história no início, mas com o tempo você começa a entendê-la através do contexto.  

Depois de muito aprontar, Alex vai para a cadeia. É aí que nos deparamos com mais um problema dessa distopia. A prisão não está conseguindo suportar tantos detentos. As celas estão superlotadas e a violência continua desenfreada. O governo decide iniciar um experimento para lidar com ela. A ideia é combater violência através da própria violência. Você acha que existe alguma chance desse experimento ter sucesso?

“A virtude vem de nós mesmos. É uma escolha que só a nós pertence. Quando um homem perde a capacidade de escolher, deixa de ser homem.”

Por mais que tenha sido uma leitura difícil e angustiante em diversos momentos, foi apenas depois de finalizá-la que compreendi a ideia do autor. Sim, confesso que demorei para sacar o que ele queria passar, de tão atordoada que fiquei com o livro. Entretanto, quanto mais pensava nela, mas compreendia sua crítica e também a genialidade do autor.

Essa é a importância de se encarar uma leitura fora da sua zona de conforto. Além de plantar uma sementinha e despertar o seu cérebro para uma crítica absolutamente significativa, também é muito importante conhecer uma obra que até hoje possui tanta relevância.

Recomendo Laranja Mecânica com muitas ressalvas. Se assim como eu, você for um leitor que possui gatilhos e não lida bem com ultraviolência, tome cuidado. É preciso sentir o momento certo para encará-la. Se você lida bem com esse tipo de coisa, não deixe de ler esse livro. Não pretendo fazer uma releitura tão cedo, mas consigo enxergar o quão importante ela foi pra mim. Portanto, não ignore o termo ultraviolência. Acredito que até mesmo para quem não tem as mesmas sensibilidades que eu, essa será uma leitura muito desafiadora.

Exemplar cedido em parceria com a editora.


Laranja Mecânica

Título: Laranja Mecânica
Autor: Anthony Burgess
Tradução: Fábio Fernandes
Editora: Aleph
Ano: 2019
Páginas: 288
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Sinopse: Alex é o jovem líder de uma gangue de adolescentes cuja diversão é cometer perversidades e atos de violência pelas ruas de uma cidade futurista governada por um Estado repressivo e totalitário. Depois de cometer um crime que termina em um assassinato, ele acaba preso pelo governo e submetido a um método experimental de recondicionamento de mentes criminosas, que se utiliza de terapia de aversão brutal.
Brilhante, transgressivo e influente, o livro traz uma visão assombrosa do futuro contada em seu próprio léxico inventivo chamado “nadsat”, que mescla gírias de gangues inglesas e palavras russas. O filme homônimo de Stanley Kubrick teve como base as primeiras edições americanas deste livro, que por conta da insistência dos editores americanos, tiveram o capítulo final suprimido, acreditando que um final sem redenção para Alex seria mais realista. Esta edição, entretanto, mantém o capítulo final original.

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One Comment

  1. Eloise

    Oi Gi,
    Eu tenho muito interesse de ler esta obra, mas imagino o quão difícil deva ser a leitura. Apesar de assistir muitos filmes terror, que acabam tendo muita violência gratuita e abordando o lado sombrio do ser humano, sempre me incomodo com cenas fortes. E deve ser ainda pior com leituras que apresentam esses aspectos, porque se eu assisto um filme e algo me incomoda, posso fechar os olhos, por exemplo, mas no livro não, eu tenho que acompanhar a leitura e imaginar a cena toda, deve ser intenso. Mas fico feliz em saber, que apesar de ser uma leitura angustiante, a história também traz reflexões, acho que isso que faz valer a pena. Gosto de sair da minha zona de conforto e quero muito dar uma chance a essa leitura futuramente.

    Adorei suas impressões!
    Bjokas!
    http://cronicasdeeloise.blogspot.com/

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